No atual estágio de desenvolvimento, tanto do Brasil como em diversos outros países, a necessidade mais básica, que é o acesso ao alimento, está saciada para grande parte da população. Aliás, a desnutrição deixou de ser um amplo problema de saúde e foi substituído pela obesidade. Assim, com a facilidade de acesso a diversos tipos de alimentos, novas demandas vão surgindo, muitas vezes impulsionadas pela rápida difusão de informações. Um forte exemplo são os questionamentos de sustentabilidade, vastamente utilizados na atualidade.
O termo sustentabilidade tem sido recorrente em diversas atividades humanas, principalmente na produção rural. Como definição é caracterizada como a habilidade de sustentar ou suportar uma ou mais condições, exposta por algo ou alguém. Atualmente, o conceito se tornou um princípio, segundo o qual o uso dos recursos naturais, para a satisfação de necessidades presentes, não pode comprometer a satisfação das necessidades das futuras gerações.
Como a comercialização de produtos, entre eles os alimentos, são provenientes de distintas regiões do planeta, estes questionamentos se tornam mais friáveis, pela dificuldade em identificar a procedência e processo de produção. Anteriormente às facilidades de transporte, que proporcionaram um grande comércio, praticamente sem divisas, a comercialização de produtos era, principalmente, local. Notadamente, este era um processo mais intenso na comercialização dos alimentos. O custo para transportar mercadorias alimentares deveria se justificar pela dificuldade de se encontrar tal produto na região ou país, como o açúcar de cana, por exemplo.
Os alimentos mais básicos da cesta do consumidor, como frutas, leite, frango, carnes, hortícolas, entre outros, principalmente os perecíveis, eram provenientes do mercado local ou adjacente. Muitas vezes, a origem do alimento era bem conhecida, sabiam-se quem eram os produtores da região ou eram produzidas na residência, como frutas, frangos, ovos, verduras e legumes. Esta identificação da origem de produção dos alimentos tem se perdido largamente nas últimas décadas. Estima-se que isto ocorra pelo aumento de volume de alimentos produzidos, pelo êxodo rural e aumento do trabalho da mulher, pela ampliação de produtos na mesa do consumidor e pela setorização da produção de determinados artigos em regiões específicas.
Nos últimos anos, frente às distintas crises na produção de alimentos, o consumidor descortinou sua baixa informação sobre os alimentos que adquiria. A origem dos produtos era completamente desconhecida, assim como, a manipulação e o processo produtivo empregado. Isto gerou desconfiança, por parte de parcela de consumidores mais esclarecidos, pois, estes alimentos poderiam carrear moléstias rigorosas, principalmente em produtos de origem animal, além de causar impactos ao meio ambiente.
Analisando estes fatos, pode-se evidenciar que os sistemas de produção intra-porteira e a garantia da segurança de alimentos estavam delicados. Mostravam-se mais debilitados ainda os sistemas de informações entre os diferentes segmentos das cadeias produtivas alimentares, o que desencadeou uma pressão dos consumidores para fornecerem tal processo e, significou um custo extra pela garantia da qualidade e da segurança e sobre as informações dos produtos. Além destes aspectos, há que considerar aspectos como preservação ambiental, bem estar dos animais e a saúde e segurança do trabalhador que está envolvido na produção alimentar. Paulatinamente, o consumidor vem também acrescentando exigências aos produtos que adquire. Isto não apenas para produtos alimentares, mas em quase todas as esferas. Obviamente, aliado sempre ao menor custo possível. Assim, a descrição do processo de produção, as garantias de sanidade e qualidade, os princípios de conservação ambiental e o respeito social têm se tornado uma exigência, principalmente para exportação de produtos agroalimentares.
Mesmo quando se observa o mercado nacional, o Brasil tem evoluído na conscientização da sustentabilidade, não ainda como a população de diversos países da Europa. No entanto, preocupações como o aquecimento global, emissões de gases de efeito estufa provenientes da pecuária, manejo animal, conservação de recursos hídricos, entre outros, têm sido destaques na mídia, nos sites de relacionamentos, nas escolas, na mídia em geral, blogs e, etc. Isto vem moldando a nova geração que vem se escolarizando. Exemplo são os games que são concebidos no intuito de criar aversão ao consumo de carnes, principalmente às crianças (fig 1).


Figs 1 e 2 Jogo do Peta: Mamãe mata os animais
Fonte: http://features.peta.org/CookingMama/
Com o aumento da demanda e da consciência do consumidor, a cada dia, em sintonia com o processo de globalização da informação, a preocupação com a qualidade dos produtos agropecuários e de seu processo de produção tem sido mais difundida, resultando em demandas semelhantes, tanto no mercado europeu, quanto no mercado americano ou de outras partes do mundo.
Com isto, além de se buscar conhecer e atender os requisitos de qualidade de produção, que garantam sustentabilidade em todas as suas esferas, a segurança do alimento e o bem estar animal, uma consolidação de marcas ou de selos de garantia de qualidade do produto e do processo produtivo tem se tornado uma premissa. Em alguns mercados ele já é uma exigência, no qual o consumidor tem como exigência, para a compra, a garantia escrita por algum processo reconhecido pelos mercados de que o produto atende aos requisitos especificados. Para tanto, há necessidade de documentos normativos que identificam os requisitos que devem ser cumprimentos para o atendimento de qualidade, tanto de produto, quanto de sistemas.
No Brasil já algumas iniciativas. No final de abril já foi publicado, em diário oficial, pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, a Comissão Técnica de Produção Integrada para carne suína. Esta comissão irá revisar e promover as adequações necessárias à atualização e ao desenvolvimento da norma, que foi concebida e validada, em conformidade com os requerimentos estabelecidos por representantes da cadeia, durante o projeto de elaboração da mesma.
A Produção Integrada Agropecuária (PI Brasil) está focada na adequação de sistemas produtivos para geração de alimentos e outros produtos agropecuários de alta qualidade e seguros, mediante a aplicação de recursos naturais e regulação de mecanismos para a substituição de insumos poluentes, garantindo a sustentabilidade e viabilizando a rastreabilidade da produção agropecuária (fig. 3.). É um processo de certificação voluntária, no qual o produtor interessado tem um conjunto de normas técnicas específicas (NTE) a cumprir, as quais são auditadas nas propriedades rurais por certificadoras acreditadas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).

Fig. 3. Pilares da Produção Integrada na Pecuária
A Produção Integrada é um sistema de produção agropecuária, baseado nas boas práticas agropecuárias, que garante preservação do meio ambiente, sanidade e bem-estar dos animais. O Mapa, em parceria com vários órgãos, já elaborou normas de produção integrada para cadeia do leite, mel, carne bovina, carne ovina e leite de caprinos. Até 2015, pelo menos cinco cadeias produtivas devem ter suas normas publicadas. A partir daí, os produtores e agroindústrias que aderirem ao sistema, e se adequarem ás regras, poderão receber o selo “Brasil Certificado” (fig.4).

Fig. 4. Selo de certificação da produção integrada na pecuária.
Ao certificar, os produtores rurais e indústrias processadoras têm a chancela oficial do MAPA e do Inmetro de que seus produtos estão de acordo com práticas sustentáveis de produção e, consequentemente, mais saudáveis para o consumo, garantindo ainda menor impacto ambiental do que produtos convencionais, a valorização da mão de obra rural e o respeito ao bem estar animal.
A primeira etapa será buscar implementar os requisitos na NTE da cadeia de produção. O processo de implementação requer organização da propriedade, adequação aos requisitos legais, tanto dos aspectos ambientais quanto sanitários e trabalhistas. Na pecuária o atendimento ao bem estar animal é um dos princípios que devem ser buscados pelo produtor.
Roberta Züge Diretora administrativa do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS)Vice-Presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários do Paraná (SINDIVET)Médica Veterinária Doutora pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP)
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